A aplicação da justa causa na rescisão do contrato de trabalho do atleta que tenta ou agride um colega de trabalho

Olá a todos, está a primeira publicação do ano, então aproveito para desejar boas festas. Assim abranjo a todas as religiões, não se tratando de um mero anglicismo tolo, mas de respeitar a todas as correntes religiosas e de culto.

O que nos motivou a escrever o presente texto foi um acontecimento retratado nesta matéria publicada no site da Globo.com (https://globoesporte.globo.com/ce/futebol/times/fortaleza/noticia/lucas-bebe-discute-com-alberto-bial-e-contido-por-companheiros-e-tecnico-da-selecao-se-manifesta.ghtml) que tem como manchete: “Lucas Bebê discute com Alberto Bial, é contido por companheiros, e técnico da Seleção se manifesta”. Adianto, assim, um tema que seria tratado no futuro: a possibilidade do clube aplicar a justa causa já que no Brasil se pensa no atleta pedindo o final do vínculo por justa causa, pela falta de pagamento de salários ou de depósitos do FGTS, por exemplo.

Ao ler a matéria temos o seguinte trecho:

“O jogador partiu para cima do técnico Alberto Bial e precisou ser contido pelos companheiros”

Ou seja, a matéria relata que houve uma tentativa de agressão ao técnico que, além de superior hierárquico, é um companheiro de trabalho que somente não se concretizou pela intervenção de terceiros, no caso de outros jogadores.

Vejamos o que fala a CLT sobre a justa causa que o empregador pode aplicar ao empregado:

Art. 482 – Constituem justa causa para rescisão do contrato de trabalho pelo empregador:

k) ato lesivo da honra ou da boa fama ou ofensas físicas praticadas contra o empregador e superiores hierárquicos, salvo em caso de legítima defesa, própria ou de outrem;

O técnico em qualquer esporte coletivo é o superior hierárquico do atleta, já que é este quem determina quem joga, quem deixa de jogar, que será substituído e é contratado pelo mesmo empregador do atleta, ao contrário do que acontece nos esportes individuais, onde é o atleta quem contrata o técnico.

Assim, é factível a justa causa ao atleta, falando de direitos assegurados pela Lei Pelé, já que a rescisão na parte trabalhista segue o estabelecido para qualquer outro empregado da equipe, pois o atleta deixa de ter direito a receber qualquer multa pela rescisão antecipada do seu contrato de trabalho.

Talvez pelos valores envolvidos no esporte em questão (o basquete), não exista o interesse em aplicar a justa causa, seja por ter uma multa pela rescisão antecipada em valores relativamente baixos, seja por este talvez nem existir. Mas este fato não retira a importância de ser analisado o tema.

É dever do empregador zelar pela integridade da saúde dos seus empregados, seja a saúde mental ou a física, por isso deve cuidar para que nenhum empregado seu sofra agressão em razão do seu trabalho, em seu local de trabalho no deslocamento por qualquer pessoa, mas sobretudo em razão da ação ou da omissão de outro empregado.

O ambiente de trabalho não pode servir para que o empregado venha a ter a sua integridade física ofendida por qualquer companheiro de trabalho, exceção como diz o próprio texto no exercício da legitima defesa, quando é utilizada uma reação física, para fazer cessar um ato injusto de violência física.

Mas o que fazer, no caso de uma ofensa verbal contra o empregado, vinda de um superior?

O empregado que, porventura, venha a ser ofendido de modo verbal por um companheiro de serviço ou um superior, não pode simplesmente partir para a agressão física do seu superior. Deve, ao contrário, buscar alguém em posição mais elevada na estrutura da empresa ou do clube, relatar o ocorrido e pedir que sejam tomadas providencias para fazer cessar estas ofensas ou que venha a surgir um pedido de desculpas.

O empregado pode ainda, a depender do conteúdo das ofensas, apresentar uma reclamação trabalhista contra o superior, com o clube respondendo subsidiariamente, pedindo a indenização por danos morais. E, dependendo ainda do conteúdo da ofensa, pedir a abertura de procedimento criminal para apurar eventual conduta do superior. Este é o caminho básico que qualquer atleta empregado pode seguir.

Mas voltando a matéria, que usamos de chave para este texto, admitindo-se que os fatos aconteceram como está na matéria, com o atleta tendo avançado sobre o seu superior e precisando ser contido, temos em tese, uma tentativa de agressão porque não sabemos o que aconteceria se não tivesse acontecido de os companheiros terem segurado o atleta.

A dispensa por justa causa deve ficar reservada para a última falta, não devendo ser aplicada de plano para as faltas mais leves, como um atraso para chegar para trabalhar ou ser reservada para a mais grave, como é a tentativa de agressão. Esclarecendo-se, desde logo, que a nossa legislação não estabelece qual seria a gradação das penas, ficando a sua dosagem a cargo do empregador e da doutrina que, em de regra, entendem que deve seguir a seguinte graduação:

Primeiro, advertir o empregado;

Segundo suspendê-lo e, ao final, se ele persistir no procedimento incorreto dispensá-lo por justa causa.

No meio esportivo, em especial no futebol, os clubes não punem o atleta de modo a aplicar a justa causa para rescindir o contrato de trabalho e, por consequência, o vínculo federativo porque esperam que algum outro clube venha pagar a multa para levar o jogador faltoso para o seu time, diminuindo o prejuízo do clube empregador com o pagamento da transferência e salários daquele atleta. Ou então faz um acordo para que o atleta não tenha mais de ficar no clube recebendo salários podendo procurar um novo emprego, sem o pagamento da multa de transferência ao clube antigo empregador.

A justa causa a ser aplicada no atleta que tenta agredir um superior vem da quebra da confiança naqueles atletas, confiança que é a base para o contrato de trabalho. Sem confiança não há razão para a manutenção do contrato de trabalho.

Não se pode manter a confiança necessária em um atleta, que pela profissão vive exposto a grande pressão, se ele demonstra que, no momento de pressão, pode se voltar contra os seus companheiros de equipe, seja tentando a agressão ou a efetivando. E mais: se analisarmos que o clube responde pelo ato de seu preposto, o mesmo pensamento pode servir para justificar a dispensa motivada, pelo receio de o atleta agredir um adversário, colocando em risco a integridade física deste, e colocando em risco a participação da equipe no torneio, se for em um jogo decisivo.

O atleta, mais que na média das profissões, deve manter o seu auto controle, mesmo quando em situação de grande pressão ou até mesmo ofensas verbais a sua pessoa, para se preservar e preservar ao seu empregador, não o prejudicando. Basta lembrar o caso de Zidane, que na final de uma Copa do Mundo perdeu o controle quando provocado por um adversário, agredindo-o e sendo expulso, prejudicando a sua equipe (o que pode ter facilitado para que a Franca perdesse aquela final)

Assim, acontecendo uma tentativa de agressão de um jogador contra outro ou seu superior hierárquico, o contrato de trabalho deve ser imediatamente rescindido, até porque a justa causa deve ser aplicar o mais rapidamente possível, para não configurar o perdão tácito da conduta do atleta. Ou, se for necessário apurar maiores detalhes, o atleta deve ser suspenso, lhe ser assegurado o direito ao contraditório e a ampla defesa para, ao final, ser decidido se houve a justa causa ou não.

Finalizo este texto pedindo a todos que se cuidem, usando máscaras, lavando as mãos com sabão, e álcool em gel, e cuidando dos seus entes queridos, especialmente os de mais idade. Neste período de Covid todo cuidado é ainda necessário, enquanto não tivermos a população toda vacinada, ou até que seja descoberta uma medicação eficaz.

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